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quinta-feira, 2 de julho de 2015

Se Moro acende a luz, há um curto-circuito no Direito

Se Moro acende a luz, há um curto-circuito no Direito:







Na página 3 da Fel-lha (ver no ABC do C Af):


Curto-circuito no Direito



por José Roberto Batochio

Excitados pelo “clamor da turba”, operadores do Direito estão mandando às favas princípios e calcando um dos pratos da balança da Justiça

“Toda vez que acende a luz do sr. Francisco Campos há um curto-circuito na democracia.” (Rubem Braga)

Francisco Luís da Silva Campos (1891-1968) foi um brilhante jurista das Minas Gerais, o primeiro ministro de Estado da Educação, em 1930, e autor de leis que modernizaram o Direito no Brasil, como o primoroso Código Penal de 1940.

Mas o prato situado à direita da balança representativa da sua concepção de Justiça era tão pesado que se inclinava na direção do fascismo. Foi com tal inspiração que escreveu a Constituição de 1937, baseada na legislação imposta à Itália por Mussolini, bem como o Ato Institucional nº 1, que deu início à institucionalização do regime militar.

Daí a fina ironia do cronista autor de “O Conde e o Passarinho”, transcrita na epígrafe destas linhas.

Transposta aos nossos dias, a blague já não focaliza apenas um homem soturno, mas se ajusta à parte de nossos operadores do Direito que, quando põem o dedo no interruptor da jurisdição penal, acendem-se espessas trevas processuais.

Trata-se de um segmento dos órgãos da persecução penal e de certos magistrados “justiceiros”, que atropelam o devido processo legal e se autoinvestem de legisladores para os casos com que se deparam e para os quais pretendem reescrever as leis penais e processuais.

Excitados pelo “clamor da turba”, na expressão de Rui Barbosa a lembrar Pôncio Pilatos no mais célebre julgamento da história, esses operadores do Direito estão mandando às favas princípios e garantias universais e calcando o prato direito da balança da Justiça.

Assistimos atônitos a um festival de prisões arbitrárias, antecipatórias da final condenação, ao desprezo pelo instituto da presunção de inocência, à submissão de réus a constrangimentos para que revelem crimes de outras pessoas, ao desrespeito flagrante às leis, ao abandono da boa prática da apuração e à correção das investigações que resultam em prova indiciária factual.

Entronizou-se no nosso processo o boato, o “diz que”, o “suspeita-se que”, de delações obtidas sabe Deus a que meios, embora saibamos, seguramente, que não são meios de Deus. Processo com sigilo decretado (só para a defesa, é claro), então, tornou-se melancólica “mentira legal” quando se trata de “vazar” dados para se assassinarem reputações e se prepararem arbitrariedades. Assistimos a esse acinte diariamente no noticiário.

A matéria é tanta que se faz necessário um recorte para que o todo não esconda a parte. Particularmente escandaloso é o desrespeito à lei nº 9.296/96, a chamada “Lei do Grampo”, que regulamenta a interceptação de comunicações telefônicas, telemáticas etc.

Seu artigo 8° é meridiano: “A interceptação de comunicação telefônica, de qualquer natureza, ocorrerá em autos apartados, apensados aos autos do inquérito policial ou do processo criminal, preservando-se o sigilo das diligências, gravações e transcrições respectivas”.

Autos apartados para preservar sigilo? Na prática, saem dos escaninhos oficiais para as manchetes. O que deveria ser sigiloso, resguardado no interesse exclusivo do processo legal, resplende em público na forma de “vazamentos seletivos”.

Ninguém jamais é identificado, muito menos responsabilizado. Exceção a essa regra é o ex-deputado Protógenes Queiroz, que não era do clube, foi condenado a dois anos e seis meses de prisão e perdeu o cargo de delegado da Polícia Federal por “violação de sigilo funcional”, isto é, forneceu à imprensa dados sigilosos da Operação Satiagraha.

Já os intocáveis hodiernos, a pretexto de “fazerem justiça”, ficam impunes. Lavram os autos nos jornais, nas revistas e nas ruas, buscando apoio fora dos tribunais, como chegou a pedir um procurador. Essas ilicitudes costumam prosperar em ambientes de decadência institucional e social, em que germinam disputas de fundo, praxe em conjunturas políticas turbulentas.

O império da lei, e aqui se trata de um ordenamento jurídico democrático e justo, esvai-se na tibieza de autoridade de uns e crescimento do poder autocrático de outros. Resta-nos esperar que o Supremo Tribunal Federal possa reconduzir a nau da Justiça ao porto da legalidade.


JOSÉ ROBERTO BATOCHIO, 71, advogado criminal, foi presidente nacional da OAB e deputado federal por São Paulo. Defende o ex-ministro Antonio Palocci na Operação Lava Jato
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Veja também:


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Marco Aurélio nunca viu tanta delação premiada







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