O futuro das empresas de mídia é um pesadeloby bloglimpinhoecheiroso |
Mas para a sociedade isso vai ser muito bom.
Paulo Nogueira em seu Diário do Centro do Mundo
Um
ditado, que afirmavam ser muito citado por Tancredo Neves, estabelece o
seguinte: “A esperteza, quando é demais, come o dono.”
A
frase se aplica às famílias que controlam as grandes empresas de
jornalismo do Brasil num momento especialmente dramático para elas. Há
uma troca de gerações, como se observou pela morte, com poucos dias de
distância, de Ruy Mesquita e Roberto Civita.
O
crescimento avassalador da internet tornará complicado gerir as
companhias que se tornaram gigantes sob circunstâncias completamente
diferentes. Todo dia – melhor, todo segundo – diminui o número de
leitores e o volume de anúncios.
Não
há volta. No seriado “The Office”, passado numa empresa que vende
papel, uma das melhores piadas aparece quando um vendedor diz a outro,
diante das quedas constantes nas vendas: “A gente recupera quando a moda
da internet passar.”
Haverá
uma transferência cada vez mais rápida de leitores, anunciantes, verbas
publicitárias e bons jornalistas rumo ao mundo digital.
Diante
do cenário desanimador, é provável que muita gente, nas novas gerações
que controlam as grandes empresas jornalísticas, desejasse simplesmente
vender o negócio. Você faz dinheiro e se livra, no ócio milionário, dos
capítulos duros da agonia inevitável.
Seria
uma alternativa excelente – não fosse a reserva de mercado que os
barões da mídia trataram de garantir para si próprios, num passado em
que nada fazia prever o surgimento da concorrência destruidora da
internet.
A
reserva é assim. Os estrangeiros podem ter apenas 30% do capital das
empresas brasileiras. Não vou discutir aqui quanto isso agride as leis
básicas de concorrência capitalista pelas quais as empresas
jornalísticas se batem tanto exceto para elas mesmas. Vou falar apenas
da ironia que essa situação esdrúxula trouxe agora.
Se
você não pode vender a compradores internacionais, e eles sim têm
recursos, está condenado a negociar com um universo bem menos opulento –
o dos compradores brasileiros.
Existe
uma justiça poética, nisso, inegavelmente. Décadas depois, a esperteza
parece estar comendo as famílias que a usaram para promover a reserva de
mercado na mídia. Porque ela, a reserva, só é, ou foi, boa para os
acionistas, protegidos de uma concorrência que haveria de resultar em
produtos melhores para os leitores e um mercado de trabalho mais pujante
para os jornalistas.
Quanto
ela é indefensável, você avalia por um artigo do novo ministro do STF,
Luís Barroso, escrito nos tempos em que ele era advogado da associação
que defende os interesses da Globo, a Abert.
No
artigo, Barroso disse que a reserva tinha a virtude de preservar as
novelas, “patrimônio cultural brasileiro”, e evitar que Mao Tsé-Tung
irrompesse nos lares brasileiros com sua pregação subversiva.
O
ajuste de contas com a esperteza chegou primeiro para a mídia impressa,
a vítima inicial da internet. Mas logo chegará também ao reino da tevê:
cada vez menos pessoas veem televisão, como se constata na generalizada
queda de audiência da Globo. Tudo converge para a internet, e já se
formou um consenso entre os estudiosos de que a televisão será a próxima
vítima.
Marcas
como a Netflix, o YouTube e a Amazon – que já anunciou que vai produzir
conteúdo de entretenimento – tomarão inexoravelmente o lugar de marcas
de outra era, como a Globo no Brasil. A famosa grade da Globo morrerá
com os consumidores que verão os programas quando quiserem, onde
quiserem e se quiserem.
E
então o serviço da esperteza ficará completo. Quando os herdeiros dos
três filhos de Roberto Marinho eventualmente pensarem em vender um
negócio que vai valer cada vez menos e doer cada vez mais, vão topar com
o mesmo quadro que massacra hoje as esperanças vendedoras das novas
gerações das famílias da mídia impressa.
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